Délora Bueno foi uma das primeiras artistas brasileiras reconhecidas fora do Brasil. Filha de pai brasileiro [pianista] e mãe norte-americana, nasceu nos Estados Unidos mas cresceu e se educou no Brasil entre o Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Minas Gerais, naturalmente absorvendo toda essa diversidade cultural. No Rio de Janeiro, estudou piano na Escola Nacional de Música. Em 1944, voltou com a família para os Estados Unidos e continuou a estudar piano e canto no Juilliard School de Nova York.
Na década de 1940 nos Estados Unidos, havia outra cantora brasileira fazendo muito sucesso, a estrela de cinema Carmen Miranda, que encantava os americanos com sua mistura ingênua de graça, sensualidade, deboche e caricatura. Os americanos, claro, queriam mais, e numa América rendida pela “pequena notável”, Délora Bueno acabou na mira dos executivos da indústria musical. Ela já vinha se destacando nas salas de concerto e em aparições no rádio, sempre apresentando nossa música, logo comandava também um programa na TV com 15 minutos de duração no ano de 1949, antes mesmo da TV estrear no Brasil.
O “Délora Bueno Show” fez sucesso, com ela a vontade em frente as câmeras. Logo expandiram o programa para 30 minutos, rebatizado de “Flight to Rhythm”. Num cenário de boate fictícia o “Club Rio”, Délora agora dividia o microfone com o cantor Miguelito Valdez, uma orquestra, dançarinos e atores que interagiam com os cantores-apresentadores. No programa, Délora também cantava músicas do repertório de Carmen Miranda...
Ela sabia que só sobreviveria se mostrasse seu próprio valor. Eram tempos em que não existiam artistas fabricados, tinha que se ter talento, e muito talento para se sobressair. Assim, Délora Bueno se destacou com seu talento genuíno, incorporou à sua música elementos folclóricos e deixou de lado o deboche. Foi solista em grandes orquestras como a de Paul Whiteman, a da Força Aérea dos Estados Unidos e da Banda da Marinha Norte-Americana.
Neste disco o contralto delicado de Délora Bueno é registrado em sua melhor forma, gravado no Brasil pela gravadora Odeon em 1955. O repertório é impecável, os arranjos incríveis e a voz doce de Délora, perfeita. “...é difícil, tão difícil separar dois coração...”
O resultado é genial, com a elegância peculiar das gravações brasileiras na década de 1950. Délora Bueno é acompanhada por orquestra, coro e conjunto regional - infelizmente não creditados. O disco abre com a belíssima valsa amazônica “Tambatajá” de Waldemar Henrique em gravação definitiva. Continua nas brejeiras “Óia o Sapo”, “Toca-Toca”, “Pingo Dágua” e “Tayeiras” retiradas do folclore. “Cobra Grande” é outra belíssima valsa amazônica de Waldemar Henrique, também em gravação definitiva; de sabor psicodélico, com a orquestra desenhando paisagens de sonhos - no caso de pesadelo. O gosto de interior do Brasil aparece nas famosas “Maringá” do mestre Joubert de Carvalho e “Casinha Pequenina” [tradicional] com destaque para o acordeon. É de se emocionar. Para fechar o disco, Délora convida a galopar com Ary Barroso em “Meu Trolinho”. Com arranjos de metais em brasa, letras alternando inglês e português e percussão marcada, “Meu Trolinho” remete à Carmen Miranda e aumenta uma certa impressão circense que acompanha todo disco, como que lembrando que é necessário ser um pouco criança para entender e se apaixonar pelo universo musical da Délora Bueno.
Délora Bueno “Cânticos Brasileiros” 1955 [Odeon LDS 3009]
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01 Tambatajá [Waldemar Henrique] canção amazônica
02 Óia o Sapo [tradicional] canção
03 Toca-Toca [tradicional] canção
04 Pingo D'água [Osvaldo de Souza] canção
05 Cobra Grande [Waldemar Henrique] canção amazônica
06 Maringá [Joubert de Carvalho] canção
07 Tayeiras [tradicional]
08 Casinha Pequenina [tradicional]
09 Upa! Upa! Meu Trolinho [Ary Barroso] marcha
Este disco é um presente do site Bossa-Brasileira e não pode ser comercializado.
Para ouvir outro belo disco de Délora Bueno, lançado em 1962, visitem a página do meu amigo Simon Boutman, que voltou a editar o seu excelente site, o Unbreakable Microgooves para nossa alegria.
2 comentários:
Obrigadão TOM, fico feliz que tenha gostado!! Abração!
Me apaixonei por essas interpretações. E depois de ouvir a voz de Delora aqui, passei meses na internet procurando mais uma cançãozinha dela, e nada. Então, se você tem aquele disco de 1962, poderia também postar aqui?
Maria, Moscou
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